O conto “Pai contra Mãe” de Machado
de Assis foi publicado no ano de 1906, no livro “Relíquias da Casa Velha”. Trata-se
de uma narrativa fortemente realista, em que o pensamento preponderante é o
capitalista.
“Pai contra Mãe” é narrado em
terceira pessoa e o narrador expõe a questão da miséria e da escravatura de
forma bastante direta e ríspida. É a história de Cândido Neves, um homem que
após tentar a vida em outros ofícios, acaba por se tornar caçador de escravos
em fuga pela cidade. Seu trabalho era capturar os escravos que fugiam de seus
senhores. Candinho, como era chamado pela família, tinha se casado com a jovem
e órfã Clara e por não ter condições suficientes para uma vida melhor, morava
com a Tia Mônica, tia de sua esposa. O casal sempre quisera ter filhos, porem
como sua situação financeira em nada contribuía, a tia sempre praguejava contra
essa empreitada. Entretanto, em certa ocasião Clara dá a notícia de sua
gravidez à família. A situação da família não era nada boa financeiramente, já
que Cândido Neves não tinha um emprego fixo, diferente de suas dívidas. Como se
observa no conto, “A vida fez-se difícil e dura. Comia-se fiado e mal; comia-se
tarde.” e compreendendo a impotência de criar um filho naquela situação a tia
sugeria firme e insistentemente na ideia de que eles deveriam levar a criança à
Roda dos enjeitados – isto é, deixar a criança num dos guichês giratórios que
haviam nas fachadas dos orfanatos, especialmente para que os pais sem condições
de criar seus filhos os depositassem anonimamente ali. Com muito pesar,
Candinho finalmente aceita a ideia de abrir mão do filho para a adoção, mas
antes, decide tentar obter dinheiro honesto uma última vez. Selecionou um
anuncio de uma escrava fugida, chamada Arminda, no jornal da cidade e deixando seu
filho recém-nascido numa farmácia, persegue a mulata e a captura. A escrava
Arminda então suplica por sua vida, afirmando que está grávida e pede piedade e
até jura serví-lo, porém o dinheiro da recompensa seria muito útil para Cândido
Neves, já que permitiria que o mesmo pudesse criar seu filho. Trava ali uma
luta com a escrava, causando um aborto na pobre mulher. No entanto, agora, com
o dinheiro da recompensa, Candinho fica incrivelmente satisfeito com sua
decisão e retorna para seu filho, para sua família, que o recebe e compreende
seus atos.
Considerando
o contexto em que o conto foi escrito e/ou ambientado, percebe-se o forte traço
de uma crítica social, comum às narrativas realistas. Há uma constante ironia
revelando valores, preconceitos e a hipocrisia humana tal como
é. Através de uma narrativa que preza pela verossimilhança, Machado perfaz um retrato social da época, sem
menosprezar as memórias da escravatura.
Como característica do período Realista,
tem-se as personagens analisadas psicologicamente e isso se revela na narrativa
do conto em análise quando o narrador estabelece uma focalização sobre a
agonia interior e desorientação de Candinho em meio às duas possibilidades de
desfecho, dar seu filho para a adoção ou encontrar a grande solução para seus
problemas e poder ficar com seu filho. Clara, a esposa, não tem muita voz ou
visibilidade no enredo. Nos momentos de diálogo e decisões importantes não se
vê participação de Clara. Parece ser uma mulher submissa aos desejos e decisões
do marido. A mulher que tem voz, ainda mais que a sobrinha é a Tia Monica,
sempre muito crítica e com a posição de quem é mais experiente, sábia e
racionalmente, deve ter sua opinião ouvida, por mais pessimista que possa ser.
Pessimismo esse que Machado busca em Schopenhauer, para reafirmar que nem tudo
que queremos pode vir a ser agradável para si, vindo a resultar em egoísmo,
ciúme. No desfecho é dela que vem o
perdão para Candinho que fará deles uma família feliz novamente.
No interim de conflitos de interesses,
observa-se que o personagem principal opta por uma decisão que revela alto grau
de egoísmo, que não faz questão de camuflar. Assim como o dono da casa em que
eles moravam que pouco se importa se a família está bem ou não, o que interessa
é que ele não está recebendo pelo aluguel e isso não é bom para os negócios.
Machado, em seu conto fortemente realista,
destaca entre outros aspectos sociais e literários, a coisificação do ser
humano que marcava a época ambientada, coisificação essa que tinha como alvo especial
os escravos, que eram levados à condição de mercadoria, fonte de renda.
2 comentários:
Obrigada!! :)
Muito interessante este conto machadiano, cada obra desse mestre retrata situações cotidianas vividas em nosso contexto.
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